Imagens de Guerra, Guerra das Imagens

Nos dias de hoje, a produção e visualização massiva de imagens de guerra levanta muitas questões, e no LEFFEST consideramos essencial dedicar algum tempo para nos questionarmos sobre a forma como a guerra é representada e as consequências que daí advêm – no imaginário individual e colectivo, na arte, na relação com o outro, e em muitas outras esferas.

A guerra sempre foi representada, desde o paleolítico (com as pinturas rupestres que ilustravam os conflitos entre clãs) até aos nossos dias (com as infinitas imagens nas redes sociais da guerra na Ucrânia ou do massacre em Gaza). Denunciar, propagandear, contar, informar, manipular... As imagens cumpriram diversos propósitos, cada qual com as suas consequências. Mas sempre foram sujeitas a converter-se em armas de guerra. E hoje em dia, mais do que nunca, uma guerra é antes de tudo uma guerra de imagens. A vitória de uma guerra depende da vitória das imagens.

A guerra está sempre diante dos nossos olhos, mesmo quando não a vivemos corporalmente: quer seja através da televisão, das redes sociais, dos jornais... A nossa acessibilidade às suas representações é infinita. Aqueles que não vêem só o fazem porque decidiram fazer vista grossa. Graças ao telemóvel, todos podem filmar, fotografar, e todos podem ver. Permite-nos ter mais facilmente testemunhos das atrocidades cometidas que podem ser usados tanto como incentivo para a acção social, como para provas jurídicas, criando um vínculo entre as vítimas e a população geral que está longe do espaço de guerra.

Mas podem servir também como meios para criar uma figura de inimigo, manipular o olhar sobre uma guerra e antagonizar opiniões, dividindo o mundo em maus e bons – sobretudo quando o que se procura no inconsciente colectivo é impactar, criar uma emoção, em vez de uma reflexão. À força de ver imagens sucessivas de destruição e de vítimas, criámos uma apatia e uma normalização da barbárie. Nas redes sociais podemos passar de uma imagem de um cadáver em Gaza a imagens de creme corporal. O tempo que passamos a olhar uma imagem antes de passar à seguinte é uma questão de segundos. Durante esses segundos, as nossas emoções estão sincronizadas, mas e a nossa reflexão? O pensamento precisa de tempo. Mas não temos tempo. A linha que separa a informação do voyeurismo imoral é muito fina e inconsciente.

No meio deste consumismo de imagens, qual é o espaço deixado à arte, e qual é o seu peso? Antigamente, as obras de arte eram o meio privilegiado para a informação, e uma fonte de conhecimento. Informavam, contavam, manipulavam, mas sempre através da procura da beleza e da estética. Hoje, parece que a guerra tem que ser representada nua e crua, sem estetização. A cada um o seu problema moral: por um lado, devemos perguntar-nos até que ponto podemos e devemos tornar belo e estetizar a miséria humana, e por outro lado, perceber quando termina a autenticidade e começa a indecência (até que ponto devemos filmar/fotografar um cadáver?)

No LEFFEST’24 queremos criar um espaço de reflexão, uma pausa no fluxo sensacionalista de imagens de guerra para pensar o seu significado, a forma como isso nos afecta enquanto seres humanos e enquanto sociedade, e o lugar das artes nessa representação. As imagens são armas de guerra, mas pode a arte ser uma arma contra a guerra?


Conversas
Slavoj Žižek e Udi Aloni
Nida Ibrahim e Alexandra Lucas Coelho
Noël Quidu

Filmes com debates

Água Prateada – Um Auto-Retrato da Síria, Ossama Mohammed e Wiam Simav Bedirxan, 2014 – Seguido de conversa com o realizador Ossama Mohammed


Noite e Nevoeiro, Alain Resnais, 1956 – Seguido de conversa com Sylvie Lindeperg

S21, la machine de mort Khmère rouge, Rithy Panh, 2003 – Seguido de conversa com o realizador
Rithy Panh


Um Adeus Português, João Botelho, 1986 – Seguido de conversa com o realizador João Botelho


Exposição
Guerra e Paz