Os filmes que o Júri considerou, ex-aequo, ter das apostas artísticas mais arrojadas da Selecção Oficial em Competição foram The Shrouds, de David Cronenberg, e Rendez-vous avec Pol Pot, de Rithy Panh. De acordo com o Júri, “David Cronenberg sempre desafiou o tempo, e cada um dos seus filmes é uma máquina na qual viajamos para territórios inexplorados: à nossa volta porque o seu olhar sobre a realidade e as suas transformações estão sempre acessíveis; dentro de nós porque os seus filmes nos olham, desenterrando medos e desejos por vezes inconfessáveis. The Shrouds leva esta viagem ainda mais além. O mundo exterior no filme é claramente o nosso, ou melhor é o mundo como será num futuro próximo. The Shrouds é ficção científica porque Cronenberg adentra-se no futuro com acuidade e ironia, como já quase ninguém o faz, e isso seria suficiente para o tornar também um filme político. Mas The Shrouds é, acima de tudo, um filme profundamente humano. A dor e o luto que animam a narrativa são percorridos sem qualquer medo, com um sentido de verdade comovente, mas esta viagem transforma-se incrivelmente para nós em energia vital. É uma dádiva. É a partir desta transformação que o cinema surge, livre, sem restrições, uma imagem após a outra, um corpo após o outro, pura beleza.”
O Júri considerou o filme de Rithy Panh “um tour-de-force conceptual, bem como emocional, de dolorosa relevância para os nossos dilemas políticos actuais. O filme alterna perfeita e corajosamente entre registos de linguagem cinematográfica: – ficção e não-ficção, reconstituições encenadas de um passado traumático e imagens de arquivo, actores de carne e osso e os seus estranhos alter-egos de madeira em miniatura, - para tornar não só visíveis, mas visceralmente sentidos - a violência, a propaganda e os horrores dos regimes autoritários. Um olhar sobre os mecanismos de poder da repressão política, enquanto as ideologias utópicas se desligam da nossa humanidade.”
Grande Prémio do Júri João Bénard da Costa
16.11.2024